Engenheira civil, CEO da Loid Engenharia e fundadora da Fundação Smart City, Loide Monteiro fala da satisfação e dos desafios de empreender e deixa um recado às mulheres: investir nas competências pessoais, conhecer bem o mercado e ir à luta.

Engenheira civil, CEO da Loid Engenharia e fundadora da Fundação Smart City. Fotos cedidas

Quando decidiu que era altura de deixar a zona de conforto para abraçar o desafio de ser uma empreendedora?  

 Sendo a minha formação engenharia, aprende-se desde inicio em nunca estar na zona de conforto. O engenheiro tem que estar sempre a procura de soluções para os problemas e necessidades da sociedade, por isso o desafio de empreendedorismo veio naturalmente, foi na sequência de procura de solução dos problemas da sociedade que me tornei empreendedora.

Que dificuldades experimentaram no início?

 As dificuldades foram várias:  iniciar numa área considerada masculina, inicialmente não inspirava confiança aos clientes, entre escolher um engenheiro homem ou uma engenheira mulher preferiam escolher o engenheiro homem. O ser engenheira não é ser gestora, inicialmente houve dificuldade na gestão da empresa nas questões financeiras, recursos humanos, marketing, fiscais, legais, etc. Também houve questão da dimensão do mercado o problema de financiamento e ainda problemas de gestão familiar porque é necessário dedicar muito tempo na empresa e tinha menos tempo disponível para família.

Iniciou numa área considerada “masculina”, que foi é a construção civil. Como foi estar numa área dominada por homens? Como olhavam para si?

Foi um desafio enorme era praticamente única mulher nessa área e tinha vários homens meus concorrentes e maioria dos clientes homens, mas não me intimidei porque conhecia as minhas capacidades. O fator crítico de sucesso foi a língua inglesa que dominava e meus concorrentes não, os clientes internacionais, que sempre foi o meu forte, escolhiam trabalhar comigo, desenvolvi uma forte capacidade comercial que me ajudou bastante. Mas algumas pessoas me olhavam com admiração porque valorizavam a minha coragem, outros não acreditavam que ia ter sucesso, foi muito difícil contratar engenheiros com experiencia para trabalhar comigo, tive que iniciar com jovens estagiários que cresceram junto com a empresa e deram um grande contributo para a empresa ser o que é hoje, por isso tenho uma grande admiração por jovens cabo-verdianos. Eles têm um grande potencial. É pena faltar oportunidades para demonstrarem o seu talento.

Houve momentos em que teve que se impor? 

 Sempre tive que me impor, até ainda imponho, não me deixo abalar pelo o que os outros pensam ou falam, faço sempre o que acredito, sigo o meu instinto e não deixo que me distraiam ou me desviem.

Qual é a maior satisfação em ser uma empreendedora?

 É ter a liberdade de fazer e explorar as nossas potencialidades sem limitações, é claro que também tem os seus riscos, mas a vida é assim mesmo. Tudo tem risco.

Como vê a mulher cabo-verdiana relativamente a abraçar causas, enfrentar desafios e serem verdadeiras empreendedoras?

 Penso que a cultura cabo-verdiana, a forma como somos ou fomos educados, não incentiva a mulher a ser verdadeira empreendedora. Somos ensinados a dar prioridade aos filhos, ao marido, a família, e ser uma verdadeira empreendedora ocupa muito tempo o que leva as vezes a não se ter muito tempo para família, casa, marido, filhos. Temos que fazer escolhas e muitas mulheres dão prioridade à família.

Ser mulher e empreendedora, em Cabo Verde, que desafios? Que constrangimentos? 

 Há vários desafios, desde os familiares, desafios do nosso mercado pequeno, desafios financeiros / financiamentos, desafio da sociedade, que ainda é machista e acredita mais no sucesso homem do que da mulher. Ser empreendedor é difícil per si. A mulher ainda tem o fator da sociedade e acaba por ficar presa ou encurralada nos preconceitos da sociedade. Temos que ter inteligência emocional para lidar com tudo isso.

É a fundadora da Fundação Smart-City. O que é preciso fazer para que mais meninas e mulheres se interessem pelas novas tecnologias e pelas STEM? 

Este ano a Loid Engenharia faz 20 anos e a prenda que resolvi dar a mim mesma por ter feito a empresa chegar aos 20 anos, foi de criar a Fundação Smart City Cabo Verde que tem como objetivos criar soluções smart para as nossas cidades, as tarefas da fundação são promover a competência, o conhecimento, o empreendedorismo, a inovação e a inclusão social. Penso que há muito trabalho a ser feito para fazer as mulheres interessarem-se pela tecnologia. Recentemente lançamos o concurso de ideias smart city Praia 2025, onde tínhamos prémios para melhor ideia feminina. Tivemos 60 inscrito e apenas 6 foram mulheres, o que foi uma deceção, pois pensei que íamos ter maior número de mulheres. Penso que há necessidade de estudar este fenómeno. Temos maior número de mulheres nas universidades, mas depois da universidade não consigo entender onde vão todos estes talentos de mulheres que terminam as universidades com melhores notas e em maior numero. Confesso que é algo que fiquei curiosa para estudar e entender o que se passa. Talvez seja necessário não apenas formar, mas também orientar, promover e incentivar, de alguma forma, as meninas, a seguir a carreira tecnológica, que é o futuro.

Quando vê para as nossas jovens e mulheres, sente que falta algo para que elas possam ser grandes empreendedoras? 

 Na minha opinião precisa de alguma orientação e de apoio financeiro, capacitação para empreendedorismo. Não é fácil ser empreendedor, principalmente quando não tens dinheiro nem para satisfazer as necessidades básicas como alimentação, muito menos para abrir uma empresa. Os bancos dificilmente financiam as empresas que estão a iniciar e com promotores sem nenhum tipo de experiência, por isso não vejo como podem ser empreendedoras. Há necessidade de programas mais direcionados para este nicho de mercado. O Governos está a criar alguns programas de financiamento que são geridos pelos bancos, mas continuamos a ter o mesmo problema porque os bancos ao fazer a sua análise de risco e como são empresas de alto risco continuam a não terem financiamento.  A meu ver deveria ter um modelo de financiamento fora do sistema bancário com menos burocracia e menos exigência, mas claro com algum acompanhamento e mentora.

Que conselhos deixa às mulheres, particularmente as mais jovens que perspetivam iniciar uma carreira?

 O conselho que deixo é que devem investir o máximo em desenvolver a suas competências, identificar a área que atividade com alguma sustentabilidade, estudar bem o mercado, não escolher algo apenas porque gosta, mas sim algo que o mercado precisa. Ser persistente, não desistir nunca, e se preparar para a luta.